A corporatocracia em ação
Quem já possui uma visão crítica acerca da atuação das transnacionais e do auto-destrutivo modelo neoliberal certamente vai se deleitar com a abordagem ácida e demolidora dessa obra.
CartaCapital, a única revista semanal impressa que ainda pratica jornalismo sério no Brasil, publicou na edição 452 uma reportagem sobre os absurdos que as empresas cometem contra candidatos a uma nova vaga de trabalho, muitas vezes submetendo-os a situações, no mínimo, humilhantes.
Depois de ler essa reportagem e tomar consciência desse fato, o filme “O Que Você Faria?” não parece assim tão absurdo. Embora algumas situações retratadas na obra sejam realmente exageradas (como o sexo no banheiro e as agressões físicas) e os personagens beirem o estereótipo, não existe ali compromisso com a realidade, mas sim com a construção de uma metáfora à loucura que tomou conta hoje do meio empresarial, especialmente das grandes corporações, onde a busca pelo lucro a qualquer preço e a exploração da mão de obra virou obsessão, com raríssimas e nobres exceções.
A verdade é que vivemos hoje numa ditadura do mercado, que alguns chamam ironicamente de “corporatocracia”, na qual a ordem mundial é dominada por meia dúzia de mega-empresas transnacionais que pairam acima de governos e estados democráticos, restando à grande maioria dos cidadãos alugarem suas forças de trabalho a elas em troca da sobrevivência diária. Acima de tudo isso, grupos de acionistas sem rosto e dirigentes absolutamente subservientes a eles dominam com mão de ferro esse sistema que, nas palavras do lingüista e ativista político Noam Chomsky, é o mais totalitário que existe – já que as ordens vêm de cima sem qualquer discussão, sobrando aos que estão abaixo a única opção de segui-las à risca sem questionamento.
“O Que Você Faria?”, uma co-produção entre Espanha, Argentina e Itália, mostra exatamente o processo de seleção para um alto cargo de direção de uma dessas multinacionais. Sete candidatos à vaga são reunidos em uma mesma sala para participarem da última etapa do processo, do qual apenas um restará. Neste ambiente inóspito, serão submetidos a um certo “método Grönholm”, que basicamente incitará os piores instintos de cada candidato na tentativa de eliminar os concorrentes.
O clima de paranóia é dobrado com a possibilidade de um deles ser um impostor, ou seja, alguém da empresa infiltrado na sala para observar mais de perto e manipular a ação dos outros. E tudo ainda pode estar sendo gravado com câmeras e microfones ocultos, numa assertiva alusão à sociedade “Big Brother” para a qual caminhamos cada dia mais, onde tudo e todos são constantemente monitorados e vigiados e, claro, os grotescos programas do tipo "O Aprendiz".
André Lux, da Agencia Carta Maior.
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