Mapa da violência
Não adianta fazer no presente o que não foi feito no passado, na esperança de que o futuro virá ser o que o hoje seria se tivéssemos feito o que tinha que ser feito no passado. A história não é linear. Para cada presente há um futuro diferente.
Os milhares de crimes que acontecem nas grandes cidades do Brasil ficam sempre obscurecidos, perdem importância, quando um, apenas um deles, é cometido por um menor de idade. É compreensível, pois além de agredir qualquer consciência o fato de uma criança ou adolescente ser capaz de uma barbaridade, esses projetos de seres humanos são sempre vistos sob um ponto de vista desprovido das verdades históricas.
O mapa da violência, recentemente traçado, dá uma ênfase especial a esses tipos de crimes exatamente porque tais delitos escancaram nossos fracassos como adultos na arte de educar, de compreender essa era glacial que é essa transição entre a infância, a adolescência e a vida adulta. Tomo emprestado de Freud a expressão “era glacial” pois foi ele quem identificou essa fase de transição do desenvolvimento da personalidade quando, segundo ele, depois da perturbadora experiência edipiana, a criança entra numa espécie de glaciação libidinal, que explodirá por outras vias, que não a sexualidade. É aí que o bicho pega. Saber lidar com esse momento é uma arte.
Se são poucos os pais que sabem lidar com isso, imagine o que acontece com as crianças “educadas” na lógica das ruas?
Ninguém suporta ver diante do párabrisa do seu carro o atestado de sua própria omissão, de seu fracasso como cidadão, como pais, como a resposta ao salve-se-quem-puder.
Todavia, diante do quadro negro da omissão social, da irresponsabilidade dos administradores e da falência das políticas públicas, vemos pequenas luzes ao fim deste túnel negro, como os resultados obtidos no Estado de Santa Catarina em relação à violência juvenil. Visto da perspectiva histórica o sucesso atual naquele Estado não é fruto do acaso, nem de sortilégios mas de um trabalho estruturado que vem sendo feito há mais de 20 anos, do qual tenho sido testemunha, iniciado naquela época pela alvas e firmes mãos de Ângela Amin Heizen Helou, esposa do ex-governador Espiridião Amin, quando presidida a FUCABEM. Cara amarrada, poucas palavras e uma compreensão que poucos tinham deste problema, Dona Ângela já praticava, nos anos 80 as políticas que apenas uma década depois seriam recomendadas pelo Estatuto de Criança e do Adolescente, o ECA.
O resultado aí está.
É certo que ajudou-a as circunstâncias positivas de seu Estado. Uma delas, a herança da colonização alemã, levou para lá a lógica européia dos pequenos latifúndios. Santa Catarina é a unidade da federação que apresenta a melhor estrutura fundiária do país. Com poucos latifúndios, o tamanho médio da propriedade rural era, naquela época, de 15 hectares.
Os anos 80 foram fertilíssimos em discussões sobre as políticas públicas dirigidas às crianças e adolescentes. Embora os progressos tenham sido muito mirrados, uma infinidade de passos importantes, pioneiros, ousados, foram dados.
Muitos exemplos de pioneirismo, coragem e visão daqueles anos devem ser lembrados.
O ex-governador Orestes Quércia é um deles. Corajoso e decidido a enfrentar o problema, Quércia criou a Secretaria do Menor e colocou à sua frente Alda Marco-Antônio. Para FEBEM, o governador nomeou a prof. Maria Inês Bierrenbach cujo chefe-de-gabinete era Luis Antônio Guimarães Marrey, atual Secretário de Estado da Justiça de São Paulo. Esta secretaria foi um verdadeiro modelo de instituição.
Magníficas experiências ocorriam em todo o Brasil. Em Minas Gerais, Tancredo Neves nomeou o prof. Antonio Carlos Costa para presidir a FEBEM, em Natal foi escolhido o prof. Nascimento Pegado, duas figuras de proa na defesa dos direitos das crianças e adolescentes. A ênfase, é bom lembrar, não era a das ações assistenciais, mas dos direitos desses pequenos cidadãos e da obrigação do Estado em ser seu guardião implacável e seu executor , quando fôsse o caso.
Assim como em Santa Catarina e na cidade de São Carlos, no interior paulista, exemplos no mapa da violência como localidades que melhor se saíram em relação à adoção de políticas sociais bem sucedidas para a infância e adolescência, nunca é demais lembrar que antes ou depois do ECA, só deram certo as ações que levaram os princípios desta lei ao pé da letra, que não transigiram nem cederam aos acenos suspeitos e argumentos mal-intencionados de quem quer mudar esta lei na suposição preguiçosa de que assim mudará a realidade.
O mapa da violência, recentemente traçado, dá uma ênfase especial a esses tipos de crimes exatamente porque tais delitos escancaram nossos fracassos como adultos na arte de educar, de compreender essa era glacial que é essa transição entre a infância, a adolescência e a vida adulta. Tomo emprestado de Freud a expressão “era glacial” pois foi ele quem identificou essa fase de transição do desenvolvimento da personalidade quando, segundo ele, depois da perturbadora experiência edipiana, a criança entra numa espécie de glaciação libidinal, que explodirá por outras vias, que não a sexualidade. É aí que o bicho pega. Saber lidar com esse momento é uma arte.
Se são poucos os pais que sabem lidar com isso, imagine o que acontece com as crianças “educadas” na lógica das ruas?
Ninguém suporta ver diante do párabrisa do seu carro o atestado de sua própria omissão, de seu fracasso como cidadão, como pais, como a resposta ao salve-se-quem-puder.
Todavia, diante do quadro negro da omissão social, da irresponsabilidade dos administradores e da falência das políticas públicas, vemos pequenas luzes ao fim deste túnel negro, como os resultados obtidos no Estado de Santa Catarina em relação à violência juvenil. Visto da perspectiva histórica o sucesso atual naquele Estado não é fruto do acaso, nem de sortilégios mas de um trabalho estruturado que vem sendo feito há mais de 20 anos, do qual tenho sido testemunha, iniciado naquela época pela alvas e firmes mãos de Ângela Amin Heizen Helou, esposa do ex-governador Espiridião Amin, quando presidida a FUCABEM. Cara amarrada, poucas palavras e uma compreensão que poucos tinham deste problema, Dona Ângela já praticava, nos anos 80 as políticas que apenas uma década depois seriam recomendadas pelo Estatuto de Criança e do Adolescente, o ECA.
O resultado aí está.
É certo que ajudou-a as circunstâncias positivas de seu Estado. Uma delas, a herança da colonização alemã, levou para lá a lógica européia dos pequenos latifúndios. Santa Catarina é a unidade da federação que apresenta a melhor estrutura fundiária do país. Com poucos latifúndios, o tamanho médio da propriedade rural era, naquela época, de 15 hectares.
Os anos 80 foram fertilíssimos em discussões sobre as políticas públicas dirigidas às crianças e adolescentes. Embora os progressos tenham sido muito mirrados, uma infinidade de passos importantes, pioneiros, ousados, foram dados.
Muitos exemplos de pioneirismo, coragem e visão daqueles anos devem ser lembrados.
O ex-governador Orestes Quércia é um deles. Corajoso e decidido a enfrentar o problema, Quércia criou a Secretaria do Menor e colocou à sua frente Alda Marco-Antônio. Para FEBEM, o governador nomeou a prof. Maria Inês Bierrenbach cujo chefe-de-gabinete era Luis Antônio Guimarães Marrey, atual Secretário de Estado da Justiça de São Paulo. Esta secretaria foi um verdadeiro modelo de instituição.
Magníficas experiências ocorriam em todo o Brasil. Em Minas Gerais, Tancredo Neves nomeou o prof. Antonio Carlos Costa para presidir a FEBEM, em Natal foi escolhido o prof. Nascimento Pegado, duas figuras de proa na defesa dos direitos das crianças e adolescentes. A ênfase, é bom lembrar, não era a das ações assistenciais, mas dos direitos desses pequenos cidadãos e da obrigação do Estado em ser seu guardião implacável e seu executor , quando fôsse o caso.
Assim como em Santa Catarina e na cidade de São Carlos, no interior paulista, exemplos no mapa da violência como localidades que melhor se saíram em relação à adoção de políticas sociais bem sucedidas para a infância e adolescência, nunca é demais lembrar que antes ou depois do ECA, só deram certo as ações que levaram os princípios desta lei ao pé da letra, que não transigiram nem cederam aos acenos suspeitos e argumentos mal-intencionados de quem quer mudar esta lei na suposição preguiçosa de que assim mudará a realidade.
Dizem que na Cuba pós-revolcionária Fidel Castro, preocupado com o elevado nível da delinquência, convocou os melhores especialistas entre pedagogos, psicólogos, sociólogos do país e disse que se eles nao fossem capazes de encontrar uma solução para o problema, aqueles cidadãos acabariam se tornando anti-sociais e seriam exterminados. A solução apresentada tinha apenas um nome. Educação.
Se as políticas adotadas por Quércia em São Paulo, em Minas, em Santa Catarina, em São José dos Campos, em Natal, somadas aos CIEPS de Darcy Ribeiro e Brizolla tivessem sido seguidas e continuadas certamente o mapa da violência seria outro e os Marcolas, crianças de rua daquela época, não teriam sido levados a buscar a sobrevivência nos buracos de formigas, nas cabeças-de-porco, nos guetos do tráfico.
Se essas coisas tivessem sido levadas a sério provavelmente nós, os Marcolas e os Fernandinhos-beira-mar estaríamos vivendo com um pouco mais de paz.
Agora, talvez, ou já é tarde demais ou seremos obrigados a adotar aquilo que o adulto Marcola chamou de “tirania esclarecida”.
Agora, talvez, ou já é tarde demais ou seremos obrigados a adotar aquilo que o adulto Marcola chamou de “tirania esclarecida”.
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