Ranhuras e rachaduras na pista da mídia - Flávio Aguiar - Carta Maior
Prossegue a campanha anti-Lula na mídia através da tragédia do acidente em Congonhas. Enquanto isso, importante livro sugere a reflexão sobre a grande mídia que ela sempre se recusa a fazer.
Apesar de todos os indícios apontarem para problemas técnicos no airbus da TAM como as causas principais da tragédia de Congonhas, talvez aliados a alguma manobra infeliz por parte dos pilotos, prossegue intensa campanha contra o governo Lula em torno do acidente. Há sempre o “mas...” de prontidão. É verdade que o airbus tinha problemas, é verdade que Congonhas é um erro acumulado por vários governos, mas... a culpa é do governo Lula e ponto acabou.
Apesar de todos os indícios apontarem para problemas técnicos no airbus da TAM como as causas principais da tragédia de Congonhas, talvez aliados a alguma manobra infeliz por parte dos pilotos, prossegue intensa campanha contra o governo Lula em torno do acidente. Há sempre o “mas...” de prontidão. É verdade que o airbus tinha problemas, é verdade que Congonhas é um erro acumulado por vários governos, mas... a culpa é do governo Lula e ponto acabou.
É verdade que é verdade que nos últimos dias houve um estardalhaço em manchetes culpando os pilotos, que teriam feito manobras inadequadas na cabine do vôo 3054, o que inocentaria a companhia aérea e a construtora do avião. Mas assim mesmo fica cada vez mais claro que as condições de vôo e as de pouso do airbus em pista molhada eram inadequadas, que os problemas vinham de dias e também que há problemas sérios de manutenção porque as companhias aéreas praticamente só têm hangares de conserto em S. Paulo, e justamente em Congonhas. Além disso fica claro que eleger esse aeroporto como ponto principal de conexão foi um erro estratégico. Se erro houve por parte do governo Lula foi o de sempre, isto é, o de agir “quae sera tamen”, isto é, o de agir sim, mas tardiamente, sob a coação dos fatos e sob a coação, a que não responde de modo adequado, da grande mídia interessada em derruba-lo, alguns nela eleitoralmente, outros nem tanto, exigindo quase a deposição manu militari ou manu populari do governo impopular – para ela, grande mídia.
Para entender as razões desse ódio quase atávico e cromossômico da grande mídia pelo governo Lula, há um livro na praça, recentemente lançado, de leitura indispensável. Trata-se de “A mídia nas eleições de 2006”, com vários autores, organizado pelo professor Venício Artur de Lima, da Universidade de Brasília (Editora Fundação Perseu Abramo). Especialista no assunto, o professor Lima publicou em 2006 o livro “Mídia: crise política e poder no Brasil”, também publicado pela Editora Fundação Perseu Abramo.
No livro de 2006 o professor analisava o comportamento da grande mídia brasileira durante a crise política de 2005/2006. Apontava para um permanente “inconformismo anti-democrático” (pág. 46) por parte de muitos jornalistas da cobertura política na mídia brasileira. Esse inconformismo, apontava o professor, atingia não só a leitura da reação das classes populares no Brasil, diante da campanha diária contra o governo Lula em jornais e na tevê e rádio, como transbordava para a desqualificação das eleições que deram vitória ao candidato popular na Bolívia ou que eliminaram a preferida dos conservadores, como no Peru. Além disso o professor fazia longa análise da intimidade histórica da Rede Globo com o poder e sobre a estrutura do sistema brasileiro de mídia, título de um dos seus capítulos.
No livro organizado em 2007, Venício Lima organizou estudos dele e de mais 15 jornalistas, acadêmicos ou não, sobre o comportamento da mídia brasileira durante as eleições de 2006. Fica claro que a grande mídia brasileira dispôs-se a impedir a reeleição de Lula, assim como agora tenta desmoralizar mais uma vez o seu governo. Para tanto imaginou colocar ranhuras na pista na reeleição, não para garantir aderência ao avião do candidato, mas para gruda-lo no solo, impedindo que levantasse vôo. Fica claro, porém, que a campanha não deu certo, e o livro procura esmiuçar as causas tanto do ódio a Lula e a um governo popular quanto do seu fracasso em sua campanha. Não só o avião levantou vôo, como a pista da grande mídia apresentou rachaduras consideráveis, expondo um hiato enorme entre seus propósitos e a realidade da opinião pública majoritária exposta nas urnas em outubro de 2006, nos dois turnos da eleição presidencial.
Em sua introdução aos 15 outros artigos, o professor Venício Lima aponta as seguintes considerações/questões/conclusões:
1. “Houve desequilíbrio na cobertura jornalística dos candidatos,verificado por instituições independentes de pesquisa”. Claro queo desequilíbrio favorecia o candidato conservador, GeraldoAlckmin. O professor também aponta o conluio entre o delegadoEdmilson, da PF, e jornalistas da Folha de S. Paulo, O Estado deS. Paulo, O Globo (e TV Globo) e Rádio Jovem Pan, “para acertarclandestinamente a versão a ser dada na divulgação das fotos” [dodinheiro apreendido com os petistas que iriam comprar o supostodossiê anti-Serra]. Assinala o professor que “a cumplicidade dosjornalistas com o delegado foi inicialmente revelada em matéria daAgência Carta Maior” (pág. 19).
2. “Prevaleceu uma atitude de hostilidade ao candidato Lula entre osjornalistas da grande mídia”.
3. “Houve um 'descolamento' entre a opinião dominante na mídia e aopinião da maioria dos eleitores”.
4.“Os sites e blogs na internet aumentaram sua importância no debateeleitoral”.
5. “A mídia entrou na agenda pública de discussão”.
6. “A 'credibilidade' da grande mídia foi colocada em questão”.
7. Novas 'mediações' diminuíram o poder de influência direta dagrande mídia.
Novidade neste campo de debate, o livro apresenta dois estudos sistemáticos sobre o papel da internete na campanha de 2006. E faz sua pergunta fundamental: “ o que fazer para avançar nas relações entre a mídia e o processo eleitoral? Como tornar essa relação mais equilibrada e democrática?”
Diante da atual “crise” aérea brasileira, cujas cores foram agravadas pela tragédia de Congonhas, esta é mais uma vez a pergunta que se coloca, uma vez que a sua politização mostra que não só a campanha de 2010 já começou, como também a de 2008, para as prefeituras, que estão na rota para o futuro do Palácio do Planalto. Aliás, essas preocupações e essas perguntas deveriam não só estar na pauta do jornalismo e da opinião pública como também na dos especialistas em comunicação do Palácio do Planalto.
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